Da favela para a crista da onda: "Doutorzinho" opera ondas de Viana do Castelo

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Mateus Bastos e Sócrates Santana movem-se por escadas estreitas e caminhos labirínticos desde que nasceram.

Moram na favela Pavão-Pavãozinho, Rio de Janeiro, na corda bamba entre a vida e a morte, que é mais certa na favela do que fora dela.

Sócrates Santana não nega a prisão do nascimento, mas foi o mar que lhe deu a liberdade de ser campeão. Em 2013, Sócrates foi campeão brasileiro de bodyboard sub-16, em 2015 ganhou o campeonato do Mundo Pro Junior em Porto Rico e em 2016 repetiu na Nazaré. Em outubro vai desafiar o oceano Atlântico em Viana do Castelo.

Mateus Bastos segue-lhe as pisadas, mesmo que uma rejeição de cedência de visto por parte dos EUA, alegadamente pela ligação da família à venda de droga no Rio, o tenha atrasado nas classificações.

Sócrates Santana tem a noção de que a família foi elemento fundamental no caminho que escolheu. O pai, que lhe morreu quando tinha apenas 10 anos, tinha uma barraca de aluguer de cadeiras e bebidas refrescantes na praia, que hoje é gerida pelos irmãos. Começou por praticar desporto na comunidade, sem pagar e regularmente: “ Se não há uma família que te guie, que te faça ir à escola, praticar um desporto, então não há dúvida de que se pode escolher um caminho mais fácil, que acaba por provavelmente ser o mais errado. Se se escolhe o caminho errado, há duas opções: ou se é preso ou se é morto.”

Nem preso nem morto, a prancha de bodyboard feita à medida quando tinha 11 anos foi tábua de salvação. O treinador via-lhe o corpo franzino, mas não duvidava de que, aos 11 anos, era clara a evidência do domínio das ondas. Só faltava uma prancha adequada: no surf é comum, no bodyboard não. Valeua Sócrates a visão do treinador.

Patrocinado por uma marca de pranchas, Sócrates e Mateus fundaram a “Favela Storm”, um movimento que dá visibilidade ao desporto enquanto tentam angariar apoios e patrocínios. Inevitável é que esta tempestade de energia assole os mais novos, que olham para eles como heróis.

Na favela onde nasceu chamam-lhe Doutorzinho. Quando o local de nascimento parece destino marcado, ser doutor é dar a volta à sorte, como se dá a volta à prancha de bodyboard: com mestria.

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